Meu namorado é mudo, mas eu posso ouvi-lo falando com alguém...

00:30Adriane Ribeiro







Meu namorado e eu nos conhecemos durante nosso último ano do ensino médio. Estávamos no clube de teatro, mais tarde descobri que ele estava lá apenas para ficar perto de mim. 
Ele sempre foi doce, dessa forma, um pouco tímido. Nós fomos a sua festa de aniversário uma noite. O resto é história. Mesmo com todas as brigas, desentendimentos, o que você quiser chamá-los, ele sempre esteve lá para mim. Eu estava pronta para passar o resto da minha vida com ele. Eu estava completamente cheia de amor no coração. Então, durante as férias de verão, após o nosso primeiro ano de faculdade, eu recebi um telefonema.

"Olá, é a senhorita ---?" perguntou uma voz masculina.
"Sim", eu respondi. "Com quem estou falando?"

"Aqui é o Departamento de Polícia. Seu namorado se envolveu em um terrível acidente."

O que veio depois disso, eu não acho que eu poderia colocar em palavras. Eu experimentei a morte antes, mas nada poderia se comparar com o medo que senti naquele momento. No minuto em que cheguei ao meu carro, eu estava correndo para o hospital, empurrando a porta para estar ao seu lado. Mas quando eu cheguei, eu fui parada do lado de fora de sua porta. 

"Antes de entrar", disse o médico em voz baixa, com uma quantidade preocupante de simpatia em seus olhos, "Eu deveria deixá-la saber que existem sequelas duradouras do acidente." Calafrios escorriam meus braços e pescoço.

 "Durante a colisão, quando a cabeça dele bateu no volante, ele mordeu a língua, não fomos capazes de recolocá-la."

Disseram que ele não seria capaz de falar nunca mais, nem mesmo com anos de terapia. Ele teria que aprender linguagem de sinais se ele quisesse se comunicar comigo de novo. Corri para o lado dele novamente e tomei seu rosto em minhas mãos, observando seus olhos se encherem de lágrimas. "Eu te amo", eu murmurei, uma e outra vez até que eu pude provar o salgado de minhas próprias lágrimas.

Em seguida, sua voz, seu rachado, gaguejando apenas uma série de grunhidos e gemidos se transformaram em soluços e ele gritou frustrado. Eu poderia vagamente entender o que ele estava tentando dizer. "Eu te amo." Era como um dono tentando treinar seu animal de estimação para falar. Ele simplesmente não conseguia fazer. E quanto mais tentava mais alto era seu grito de frustração, e mais enfermeiros vieram para tentar dominá-lo. Lutaram até eles colocarem uma seringa em sua pele, e eu assisti, lentamente, ele desaparecendo.

Alguns meses se passaram e as coisas ficaram mais calmas. Alex, meu namorado, estava fazendo cursos on-line, enquanto eu trabalhava para pagar o aluguel do apartamento que dividíamos. Às vezes, conseguiamos esquecer as coisas quando assistíamos TV juntos. Sua risada nunca mudou. Ele ficava enfurnado em seu quarto todos os dias, só saindo para comer ou usar o banheiro. A forma que eu via ele, me cortou como uma faca. Às vezes, eu ia na sua cama e deitava ao seu lado. Certa noite, ele já estava dormindo, e eu dormia há horas quando fui despertada apenas por um grito, suas mãos estavam trêmulas enquanto ele chorava.

Um dia, cheguei em casa e Alex estava num silêncio familiar, se preparando para o jantar, até que ouvi um som fraco vindo do quarto. Curiosa, eu encostei meu ouvido na porta, e que eu ouvi congelou todo o meu corpo. De algum lugar lá dentro, eu ouvia Alex, verdadeiro Alex, o velho Alex falando. Falando palavras reais, como se estivesse conversando. O choque me impediu de entrar. Minha mente freneticamente tentava racionalizar o que eu estava ouvindo. Poderia ser um vídeo antigo, mais não parecia nada ao certo. O pavor em cima de mim me disse para me afastar da porta. 

Eu tentei não pensar nisso, como nada disso ocorreu novamente na semana, eu deixei para lá. Eu tirei da minha mente até o fim de semana, quando eu acordei no meio da noite para ir ao banheiro.

Lavando minhas mãos, eu ouvi um barulho e imediatamente tive arrepios. Eu fechei a torneira e ouvi atentamente. Ela veio de novo, a voz de Alex murmurando algo baixinho, parecendo conversar com alguém no quarto. Desta vez, eu estava realmente preocupada com ele, então eu resolvi abrir uma fresta da porta, e o barulho parou imediatamente.

Alex estava exatamente onde ele estava antes, debaixo das cobertas. Talvez tivesse sido minha imaginação. Suspirei aliviada, e voltei para a cama abraçando seu corpo quente. Acabei dormindo ouvindo sua suave respiração e seu batimento cardíaco, algo sussurrou: 

"Eu te amo". Foi Alex.

Eu estava petrificada depois disso. De alguma forma, eu voltei a dormir, mas na parte da manhã saí antes de Alex ter acordado. No trabalho, eu não conseguia parar de pensar nisso. 

Eu não poderia acreditar que fosse real. Alguns dias depois disso, eu notei pequenas coisas sempre que eu estava em casa. Enquanto eu lia na sala de estar, eu ouvi um baque e mais murmúrios. Ele continuou e continuou, até que eu não podia mais deixar pra lá. Eu finalmente falei com ele sobre isso.

Eu não queria que soasse de forma ridícula. Alex já tinha enfrentado tanta coisa, eu não queria abrir mais feridas acusando-o de falar quando ele nem sequer tem uma língua. Eu me senti egoísta, mas eu tinha que fazer alguma coisa, pois eu estava com medo que eu estivesse ficando louca. Quando eu finalmente perguntei-lhe, tudo o que ele fez foi ficar em silêncio. Quero dizer, ele não usou seus grunhidos para me dar uma resposta, nem nada. Apenas sentou-se ali, me olhando, antes de se virar e bater a porta atrás de si. Eu me senti como uma idiota total. Ele provavelmente estava tão chateado com o que eu tinha acabado de dizer que ele não podia nem me responder. Eu estava sendo horrível.

Depois disso ele não quis falar comigo. Três dias se passaram, e nenhuma palavra foi dita entre a gente. Os murmúrios e pancadas pararam depois disso, mas à noite, na cama, ele ficou do outro lado. Eu nem podia mais sentir o seu calor. Eu bebi e fiquei fora enquanto a minha carga de trabalho ficava mais pesada e o estresse de cuidar de Alex e tentar remendar a relação se manteve por dias.

Eu finalmente decidi acabar com isso e parar a frieza entre nós, e delicadamente ficar ao seu lado na cama à noite. Quando cheguei no prédio, meu sangue gelou e eu queimei com medo e preocupação. Não era ele, era um truque. Eu o procurei por todo edifício. Eu estava em pânico, tentando lutar contra as lágrimas. A polícia estava procurando por ele, e eu estava fora de mim, tentando me acalmar.

Ouvi um som que veio do beco ao lado do nosso prédio. Nosso bairro não é dos melhores, e é por isso que eu sempre tenho uma faca na minha bolsa. Eu estava prestes a ir para dentro quando ouvi uma voz.

 "Isso não é... nós dissemos..."

Pude ouvir tranquilamente cada palavra, mas eu definitivamente sabia a quem pertencia. Sem pensar, eu corri os degraus da escada e me virei, vendo duas figuras no escuro.

"Alex!"

Eu fui para fora, em direção ao beco. Ambos se viraram para mim. Perdi a cor depois do que vi. O da esquerda era definitivamente o meu namorado, ainda usando as mesmas roupas. A luz iluminava suas feições.

A figura da direita era mais escura, estava mais escondido da luz e era muito mais alto do que Alex, tanto que estava um pouco curvado para frente, e os seus braços balançavam pelas laterais. Quando olhei em seu rosto, a pessoa... ou qualquer coisa que fosse, eu juro por Cristo, começou a subir a parede do prédio. Não se movia como nenhum humano. Em apenas alguns segundos, desapareceu em algum lugar do telhado. Eu tremi violentamente, Alex correu e me agarrou para me impedir de desmaiar.

"O que é que foi isso?" Eu consegui gaguejar. Ele apenas me olhou nos olhos, sem expressão. 

"Você não deveria ter vindo me procurar."

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